quinta-feira, 20 de dezembro de 2018

a força da abnegação
ler-se-á na corrente do rio a forma
como tende a árvore que
sobre o rio pende

sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

a fronteira
essa linha imaginária em que tropeçam os povos
lá se plantam estacas se amarram arames e redes
lá surgem muros se criam quintas galinheiros e currais
lá corta nações se não as pode bordejar

a fronteira tem fraquezas que formam poderes

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

ao católico

todo o caminho leva a uma cruz: um braço longo que continua, outro para a esquerda e mais um para a direita; sugere-se que possa optar e acaba, sempre, escolhendo a cruz

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

e as horas?
jogá-las em estrofes
de versos badaladas
o sino recitando
um poema impossível
a sonância da memória
numa cadeira gasta
palavras badaladas
e de tão ocas gerarem ecos
e soando nada se ouve além de
ruído
e se o tempo demorando-se
os dias soltos deixasse
e a árvore crescendo frutos libertasse
o hálito a seiva
de quem ama abraçando
de quem protege permanecendo
e o tempo nos ramos tomasse
embalando-o a murmúrios de brisa
e voos de pássaro,
ilustrando os segredos da criação

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

escrever um sino e
alto, bem alto o colocar
ao cimo mais cimo e
ele alcançar
onde as ruas curvam
em lugares escuros
onde o silêncio manda

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

essas palavras semeadas com desgoverno
dispõem-se em poemas
mordem os passos
ora obrigam a correr ora fazem voar

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

que tomas nesse cabelo ao vento
ideias leves
sonhos de esvoaçar
abrigo ventos e outras suavidades
vendavais

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

ficar assim
ausente
em dormente estado
olho cerrado
como a repousar
e sentir pairar
viver a paz
ensaio da morte
ainda de ninguém
e que não me peçam
para ir a além

ouve-me

ouve-me
e desperta o dia
sem que acorde deste murmúrio de ser

inclinou-se
o tempo já não chega de raspão
entra e sai a pique
fende muros e corpos
ofende olhos e janelas
decepa almas e ilusões

ouve-me
não te inquietes
deixa o gato preguiçar no melhor lugar
toma-lhe esse prazer sem desejo
preserva  esse tesouro
breve, porém eterno
as árvores
aqueles seres que parecem pássaros
brotam ninhos
como flores
e se cobrem de verde cor de penugem
tocam o chão
e sendo árvores
voam ao tempo
como os pássaros
balanceando
o voo perpétuo
das aves
que sendo seres do céu
e quase árvores
habitam as árvores desde dentro
que se viu parecerem pássaros

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

aquela que em seus ais
amachuca o rosto entre mãos amargas
por destino

tem esperança.
trá-la ao peito
no sorriso invisível de um pensamento.

não é poesia
o que a leva ao mar
nem há versos em vento,
sal e espuma, só perdimento.

e perdida se cumpre


* inspirado em sophia de mello breyner andresen; aquele que partiu

terça-feira, 7 de agosto de 2018

comunhão

olha, soletra a cor do mar e diz
o que sentes, essa metamorfose
de chamar de dentro o que é de fora
para ser nosso e a nossa essência
...
que simultaneidade maravilhosa

quarta-feira, 20 de junho de 2018

o rubor ao soletrar-te, agarravas-me
pela mão, o dia nascia
inteiro, a nós se fazia
e o mimávamos, depois

montávamos nesse alazão
não pelo partir, só para chegarmos
onde as pétalas são

terça-feira, 15 de maio de 2018

se o sono corre atrás do que perdemos,
já perdemos tudo
pinta com teu amor
todas as coisas lindas que procuras
serão tuas ainda antes de respirares
minha mãe revela-me o mundo inteiro
a cada beijo
a cada carícia
a cada olhar
que eu vou descobrindo aos poucos
serei as promessas que faço a mim mesmo
que as soube, sempre, ainda antes de ocorrerem,
desejos serem, ambições até,
utopias a engrandecerem do peito para fora,
tal sol quente
que aquece
porque irradia o que lhe vai por dentro

quinta-feira, 10 de maio de 2018

eutanásia

o que de nós perpassa
é o gume frio do orvalho lúcido da manhã
ou o entardecer embalado pelo rumor do dia?

ontem recortávamos bonecos de papel
que desdobrámos pelas janelas. a casa era nossa e
a alegria pertencia-nos.

o jardim corre (ou corria?) para nós,
toma-nos para uma roda. e abandonámos a mão...

os olhares não urdem
nada.

é outono. a folha cai sem significado.
ao gelo da madrugada responde o adormecimento.

entardece invernoso e escuro.
o horizonte hoje não veio.

segunda-feira, 7 de maio de 2018

teu nome

teu nome
escreve-o 3 vezes
lê-o 3 vezes
ouve-o, escutando-te
3 vezes, soletra-o
corre-o de trás para a frente
e no inverso
se zoar íntimo
teu nome será

a palavra

a palavra em si mesma é inacabada
o som que perpassa dá-lhe íntimo.
no verso suspende-se, a palavra viva
brinca, paira.
no poema a palavra enche prenhe
a cor e forma.
a leitura corre tonalidades
de onde despontam primaveras.
claro, isto são dizeres de
imperfeições suspensas
pendentes de intimidades
talvez fecundas, como as estações

segunda-feira, 9 de abril de 2018

empurravas-me
encosta a baixo que me fizesse ao voo
eu agarrava-te na vertigem do chão que fugia
e ficavamos-nos nos braços pairando
na permanência de quem se ama

sexta-feira, 6 de abril de 2018

glossário ainda sem título

nascer
a imortalidade em ideia
o voo ao futuro

imortalidade
tédio como modalidade
inalcançável

ideia
explosão na vacuidade
a luz
o estrondo
eureka
se germina é inodora
insonsa e insonora

voar
a arte de pairar
batendo asas
ou não

futuro
uma probabilidade
em que se acredita
escrita com efe ou fê
como fé

poemar
sem tempo
reformar o sentido para sentir
voar de pés na terra
voar nos pés da terra
poderia até
de um gesto acender a luz
que ilumina o firmamento
para ser todo
para ti

sexta-feira, 23 de março de 2018

alimento
a profunda angústia para escrever
impossibilidades que vão em mim
o desassossego de as tornar possíveis
as ânsias de as encarar
desenhei voos como os sentia
brisas e suaves em cor maresia
a borboleteei no tom de jardim
bulindo fora e dentro de mim

quarta-feira, 21 de março de 2018

galgar

o verbo dos galgos
da braveza do mar
da folia do brincar
da coragem a esbanjar
da extravagância do rio
da cobiça de vencer
do ímpeto de uma lebre que foge de morrer
de um galgo que tudo galga atrás dela a correr

segunda-feira, 19 de março de 2018

quando eu morrer será amanhã.
a luz apagar-se-á solene

mirarei a sala sem desejar ir

deixarei o murmúrio do público
entrando na noite lá fora

e pairarei, como eu gosto

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

monólogos

 de que lado me olhas?
 como se fosse sábado
 gostava que me visses domingo
 sábado é o início e o auge
 domingo é a solenidade
 e domingo é cansaço
 e o descansar
 acordar de ressaca
 domingo tem o entusiasmo da roupa nova, a festa e...
 gosto de partir ao sábado e deixar o domingo para reparar
 vês-me sábado?
 queres-te domingo?
(silêncio)
 acho que o lado esquerdo me favorece mais...

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

sonho com os dias
abertos à luz, simples,
de coisas belas como os voos,
essas aragens frescas e
rodopiantes.

à pedra, talha-a a água inquieta
nem sempre pura
afiada de macieza e convicção
de envolver envolvendo-se.

dizer é um compromisso
convicto de envolvência.

à sombra inaudível da palavra
o impronunciável responde surdo,
em gesto vago
sumido e rouco de coisa cansada.

e o dizer morre
ainda antes de nascer

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

nascerão pássaros e voarão dias
a colina recortará sol e nuvens
o mar zoará rouco
o bucólico terá a brevidade de um sopro
a inexistência será minha por um instante
eu imitá-los-ei como fiz a vida toda

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

escrevamos todas as letras de uma vez só
PLAM!!!!!
e teremos um abecedário chapado
onde quer que seja, todas as letras
um gorgolejo
a sonância duma probabilidade

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

é manhã

as ruas correm, sem esvaziar,
para as vielas, adentram portas,
um corrupio de frenesins, onde pára a quietude?

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

as flores não caem, desfolham,
transformam-se para esvoaçar, pétala a pétala,
e o fruto prospera ao redor da semente, preparando a sementeira