o som era de violino
encorpado em gente pobre
pelo abandono
as cordas vibravam, via-se
em garganta de anjo
ressoavam em peito de deus
e soavam pelos túneis
entranhando-se
naquele bocadinho de vida
dos transeuntes de olhos fixos
no nada ouviam
conforto de ser
daquele lugar de todas as horas
intemporais, passavam
dançados, confessados, apressados
deixando um nada de si
(a minúscula moeda)
suficiente para manter a voz
um violinista, ali, adrajo
a comunhão de almas que se tocam
a economia de arte
dá-se do fundo mais profundo
a troco de trocos
creio que o conforto de alma não tem preço
creio que ninguém pode pagar por ele
creio que todos os trocos são blasfémia
terça-feira, 31 de dezembro de 2013
fantasiando
conheci-te
conheço-te, reconheço-te
decalcas movimentos
à contraluz conversas
que guardei minhas
revês, aqui e ali,
o modo de estar
nas memórias
nas recordações
engendradas pelo tempo
já não sei se vivo
se revivo,
se recordo ou se invoco
que seria do presente
sem as recordações passadas
sem as memórias futuras?
conheço-te, reconheço-te
decalcas movimentos
à contraluz conversas
que guardei minhas
revês, aqui e ali,
o modo de estar
nas memórias
nas recordações
engendradas pelo tempo
já não sei se vivo
se revivo,
se recordo ou se invoco
que seria do presente
sem as recordações passadas
sem as memórias futuras?
quinta-feira, 26 de dezembro de 2013
saudade
minha saudade
é de trepar aos mastros
não que a saudade tenha mastros
nem mar ela tem
tem recordações caravela de antigas
e nela se navega, fosse mar
é de trepar aos mastros
não que a saudade tenha mastros
nem mar ela tem
tem recordações caravela de antigas
e nela se navega, fosse mar
pôr-de-sol
foi blasfémia
chamaram-te passageiro
quem não te vê todos os dias
não lêem no poema
a poesia além da rima
e no papel vazio
não encontram poesia
chamaram-te passageiro
quem não te vê todos os dias
não lêem no poema
a poesia além da rima
e no papel vazio
não encontram poesia
sábado, 21 de dezembro de 2013
oblíquo
oblíqua, a escrita
inclinado, o poema
erguido por um homem
perpendicular ao sol
que vive no meio (do) dia
e que se derrama
letra a letra
em vaga inclinação
a obliquidade
inclinado, o poema
erguido por um homem
perpendicular ao sol
que vive no meio (do) dia
e que se derrama
letra a letra
em vaga inclinação
a obliquidade
quinta-feira, 19 de dezembro de 2013
centro comercial em 10 itens
- um centro comercial é uma catedral de compras, há sempre um altar onde comprar;
- um centro comercial é um sítio onde se passeia, divaga e vagueia, se convive e namora, onde se compra e onde se transeundam os amigos do consumo;
- um centro comercial é um microclima onde as estações do ano chegam e partem mais cedo;
- um centro comercial é um culto caro feito de pechinchas;
- um centro comercial é um lá fora insípido e acético, sem chuva, sem sol, sem vento, sem frio e sem calor;
- um centro comercial é um lá fora com um estacionamento dentro de portas e wc limpos;
- num centro comercial o esforço de subir é igual ao de descer pela boleia da passadeira rolante;
- no centro comercial há 2 prateleiras, desajeitadas e reduzidas, dedicadas à poesia;
- num centro comercial rareia a poesia; usam-na para decorar clichés;
- um centro comercial é a caverna onde se revela a alegoria.
ao cantar do galo
o peito…
o meu caiu algures ao acordar
entre o céu e o mar
numa terra d'além
onde o vento marulha
e inquieta é a dor
minh'alma...
desalmou com o peito
inquieta
pecadora
baloiçando
sob um raio de sol
meu olhar...
persegue-os
cantadeiro
da dor
(sem sentido)
ao calor soalheiro
o meu caiu algures ao acordar
entre o céu e o mar
numa terra d'além
onde o vento marulha
e inquieta é a dor
minh'alma...
desalmou com o peito
inquieta
pecadora
baloiçando
sob um raio de sol
meu olhar...
persegue-os
cantadeiro
da dor
(sem sentido)
ao calor soalheiro
meu sonho
uma dia
escolherei uma mão
talvez a direita
com que agarrarei o coração
com ele escreverei
um poema
de passagem
sem início
sem fim
escolherei uma mão
talvez a direita
com que agarrarei o coração
com ele escreverei
um poema
de passagem
sem início
sem fim
supresa
um dia a vida assoma-nos farta
prazerosa
linda, de despontar
bela, de frescura e outros aromas
gostosa de viver
e dizemo-nos a sonhar
(pois)
acordemos, que os sonhos
só duram se forem vividos
prazerosa
linda, de despontar
bela, de frescura e outros aromas
gostosa de viver
e dizemo-nos a sonhar
(pois)
acordemos, que os sonhos
só duram se forem vividos
quarta-feira, 18 de dezembro de 2013
perspicuidade
quando meus olhos perderam as lágrimas
percebi que nunca as tiveram
eram ondas das marés
notava-se pelo movimento
de mar
e o horizonte ondeava
uma linha indefinida
percebi que nunca as tiveram
eram ondas das marés
notava-se pelo movimento
de mar
e o horizonte ondeava
uma linha indefinida
bom dia
que te sorria, o dia
cheio
como o peito
escapando pelo olhar
de tão cheio
ateado em poesia
bom dia
cheio
como o peito
escapando pelo olhar
de tão cheio
ateado em poesia
bom dia
terça-feira, 17 de dezembro de 2013
desencontro
sem palavras
seco
sem o cristalino
sabor da chuva
em gotas
sem pingo luz
seco
sem corrente
de letras, nem escorrentes
mirrado d'alma
sem poema
desencontrado da poesia
seco
sem o cristalino
sabor da chuva
em gotas
sem pingo luz
seco
sem corrente
de letras, nem escorrentes
mirrado d'alma
sem poema
desencontrado da poesia
domingo, 15 de dezembro de 2013
degraus
há os subidos
os descidos
ainda os tropeçados
e os escorregados
também os outros
onde passamos sentados
os descidos
ainda os tropeçados
e os escorregados
também os outros
onde passamos sentados
sexta-feira, 13 de dezembro de 2013
história suspensa
viviam uma história de campanário
um badalava as horas
a que outro respondia, contando cada batida
intercalados na vida
o que um fazia dia sim, dia não
o outro repetia dia não, dia sim
conversavam e ainda convivem
certos no tempo, que é o deles
uma história suspensa
sem curso e sem fim
um badalava as horas
a que outro respondia, contando cada batida
intercalados na vida
o que um fazia dia sim, dia não
o outro repetia dia não, dia sim
conversavam e ainda convivem
certos no tempo, que é o deles
uma história suspensa
sem curso e sem fim
quinta-feira, 12 de dezembro de 2013
morrer de amor
morrerei quando quiseres
não precisas pedir
nem dizer
é só quereres
fecharei meus olhos
guardarei teu rosto
suspirarei fundo
e morrerei por ti
como sempre morri
de amores
não precisas pedir
nem dizer
é só quereres
fecharei meus olhos
guardarei teu rosto
suspirarei fundo
e morrerei por ti
como sempre morri
de amores
clausura
se acreditas que o teu fogo
se gasta acendendo o cigarro
então é verdade
se acreditas que o frio
é o que sentes em janeiro
então é verdade
tão pouco que sabes de ti
tão pouco te deste a saber
e nunca morreste.
como poderias sentir o fogo do renascer
se desconheces o gelo do transe?
deve ser verdade
se gasta acendendo o cigarro
então é verdade
se acreditas que o frio
é o que sentes em janeiro
então é verdade
tão pouco que sabes de ti
tão pouco te deste a saber
e nunca morreste.
como poderias sentir o fogo do renascer
se desconheces o gelo do transe?
deve ser verdade
terça-feira, 10 de dezembro de 2013
desassossego
tu olhas-me
eu perco-me
beijo-te íntimo
o mais que posso
toco-te porque me controlo
meu desejo é apalpar-te
agarrar-te fundo
como te sinto
minha
eu perco-me
beijo-te íntimo
o mais que posso
toco-te porque me controlo
meu desejo é apalpar-te
agarrar-te fundo
como te sinto
minha
saudade
em mim
banco de jardim, desbotado
enrolado leve do vento
repousa a folhagem
partirá depois das pétalas
que eram delicadamente brancas
e murcharam
(e)
dissipam-se as formas do tempo
nas pregas deste entendimento
tão garatujo de ser
banco de jardim, desbotado
enrolado leve do vento
repousa a folhagem
partirá depois das pétalas
que eram delicadamente brancas
e murcharam
(e)
dissipam-se as formas do tempo
nas pregas deste entendimento
tão garatujo de ser
nostálgico
lembro-me do tempo de inverno
as poças d'água gelavam
partíamos o gelo
e gostávamos, lembro-me
lembro-me que os dias nasciam
com o sol nascente
a terminavam num aconchego na cama
lembro-me
lembro-me do pôr-do-sol
ser um momento mágico do dia
aguardava-o, via-o sempre
tão longínquo, lembro-me
lembro-me da minha avó
e dos doces olhos, quase cegos
mimava-me de longe
receava que eu não gostasse, lembro-me...
lembro-me dos meus amigos miúdos
amizades grandes, mais que irmandades
lembro-me
lembro-me que ontem detestei meu dia
que o senti perdido de tempo
como desejei esquecer-me, lembro-me
lembro-me do peso da nostalgia
e do cheiro que tem, sinto-o
as poças d'água gelavam
partíamos o gelo
e gostávamos, lembro-me
lembro-me que os dias nasciam
com o sol nascente
a terminavam num aconchego na cama
lembro-me
lembro-me do pôr-do-sol
ser um momento mágico do dia
aguardava-o, via-o sempre
tão longínquo, lembro-me
lembro-me da minha avó
e dos doces olhos, quase cegos
mimava-me de longe
receava que eu não gostasse, lembro-me...
lembro-me dos meus amigos miúdos
amizades grandes, mais que irmandades
lembro-me
lembro-me que ontem detestei meu dia
que o senti perdido de tempo
como desejei esquecer-me, lembro-me
lembro-me do peso da nostalgia
e do cheiro que tem, sinto-o
domingo, 8 de dezembro de 2013
sábado, 7 de dezembro de 2013
luto
a cobardia
é um bicho medonho
primeiro alimenta-se dos medos
depois dos homens
das multidões
e quando chega aos povos
morrem os ideais
padecem os países
no meu país
mandam ignorantes medrosos
semeiam fantasmas no povo
germinam cobardias
matam os ideais
que nos fizeram país
são medonhos
antes fossem bichos
é um bicho medonho
primeiro alimenta-se dos medos
depois dos homens
das multidões
e quando chega aos povos
morrem os ideais
padecem os países
no meu país
mandam ignorantes medrosos
semeiam fantasmas no povo
germinam cobardias
matam os ideais
que nos fizeram país
são medonhos
antes fossem bichos
sexta-feira, 6 de dezembro de 2013
neste jardim
neste jardim
as velas se enfunam
só para acompanharem os pássaros
que voam pelo destino
que um dia escolheram
ainda habitavam o pequeno ovo
e já sonhavam, no calor do choco
com jardim do ninho
e o dia em que estenderiam asas
tremendo de coragem
saltariam. e vogando
seriam nau e descobrimento
deste jardim
as velas se enfunam
só para acompanharem os pássaros
que voam pelo destino
que um dia escolheram
ainda habitavam o pequeno ovo
e já sonhavam, no calor do choco
com jardim do ninho
e o dia em que estenderiam asas
tremendo de coragem
saltariam. e vogando
seriam nau e descobrimento
deste jardim
aconteceu
tropou à porta de mim
que nem era minha
era de uma certa consciência
que eu nunca vira
que mal conhecera.
ela, que propalava ser minha
ignorou o tropar
ainda que este voltasse
mais e mais, sem sossego.
ora sucedeu
que o tropar emudeceu
e a consciência adormeceu
que nem era minha
era de uma certa consciência
que eu nunca vira
que mal conhecera.
ela, que propalava ser minha
ignorou o tropar
ainda que este voltasse
mais e mais, sem sossego.
ora sucedeu
que o tropar emudeceu
e a consciência adormeceu
beata
teu colo é de um rosário
que acaricias nas mãos
conta a conta
onde intercalas ladainhas
suspiros e desejos
de tudo e do céu
carinhoso rumorejo
meiguice ao alto no olhar
cruzas teu peito
de um bailado de mãos
coroado dum ósculo
te consagras e proferes
"uma boa horinha"
que acaricias nas mãos
conta a conta
onde intercalas ladainhas
suspiros e desejos
de tudo e do céu
carinhoso rumorejo
meiguice ao alto no olhar
cruzas teu peito
de um bailado de mãos
coroado dum ósculo
te consagras e proferes
"uma boa horinha"
quinta-feira, 5 de dezembro de 2013
loucura
a loucura tem um dia
como a morte
enlouca-se, morre-se
e nada se mantém
ou de nada valeu
enlouquecer eu morrer
no dia da minha loucura
enlouquece-me
como se tivesse frio
muito frio
e precisasse do teu corpo
para me enlouquecer
no dia da minha loucura
discorda de mim
concorda comigo
mas não me fites indiferente
nem me cites pelo que lês
no dia da minha loucura
sopra-me um beijo
se puderes
toca-me por um beijo
que a minha loucura
se fará pura
como qualquer forma de vida
como a morte
enlouca-se, morre-se
e nada se mantém
ou de nada valeu
enlouquecer eu morrer
no dia da minha loucura
enlouquece-me
como se tivesse frio
muito frio
e precisasse do teu corpo
para me enlouquecer
no dia da minha loucura
discorda de mim
concorda comigo
mas não me fites indiferente
nem me cites pelo que lês
no dia da minha loucura
sopra-me um beijo
se puderes
toca-me por um beijo
que a minha loucura
se fará pura
como qualquer forma de vida
quarta-feira, 4 de dezembro de 2013
beijos teus
teu beijos, acatei-os
uma a um
confissões de sentidos
onde as palavras mordiscam os sentimentos
onde a emoção consome a voz
eram húmidos
colavam-se na pele
onde fitavas o olhar
revelaram-se
e desvendaram-te
uma a um
confissões de sentidos
onde as palavras mordiscam os sentimentos
onde a emoção consome a voz
eram húmidos
colavam-se na pele
onde fitavas o olhar
revelaram-se
e desvendaram-te
mar prateado
deste mar tirei um lago
longo, escuro, largo
nele cresci uma ilha
que não plantei
de tão sombria
o sol nem tinha luz
que a alumiasse
estive
até o sorriso me nascer
como sol da manhã
das memórias
que um dia guardei de ti
o mar
sempre navegante
evaporou o lago
onde a ilha já se havia afundado
e escolheu-se prata
para oferecer o brilho matinal
longo, escuro, largo
nele cresci uma ilha
que não plantei
de tão sombria
o sol nem tinha luz
que a alumiasse
estive
até o sorriso me nascer
como sol da manhã
das memórias
que um dia guardei de ti
o mar
sempre navegante
evaporou o lago
onde a ilha já se havia afundado
e escolheu-se prata
para oferecer o brilho matinal
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