quinta-feira, 17 de abril de 2014

chegadas

i
cheguei
num poema, o desentendo
desdobra-se, o poema
no silêncio do cachão
onde a leitura jorra

ii
cheguei
carreado num pensamento
que não alcanço, perdi-me
nele, que me encontrou
e me guiou até aqui

iii
cheguei
donde nunca regressara
donde o vento nunca sopra
donde o sol não descobre
donde tudo se envergonha

iv
cheguei
do outro lado da montanha
onde os desertos correm
em colinas que desaguam
em dunas espraiadas à beira-mar

v
cheguei
onde a luz se apagou
onde a casa morreu
onde o lar desistiu de ser
até ao verbo

vi
cheguei
do inferno do limbo
da dor moinha
da chuva miudinha
da partida do dia

vii
cheguei
do mais longe que pude
do outro lado da rua
onde avenida se encerra
para que passe o mar

viii
cheguei
de um linha sem fim
enovelado
de horizonte perdido
fio de estendal esquecido

ix
cheguei
donde não havia poesia
donde a vida é tão fria
donde o fogo não arde
nem conhece a paixão

x
cheguei
de onde o mar coalhou
de onde as ilhas se ancoram
desertas, humanamente
como os desertos são

xi
cheguei
onde nunca fui nem irei
onde ainda não existe
sabendo que quando existir
em vez de chegar, partirei

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